ARTIGO DA SEMANA
Aras no Supremo: PGR soteropolitano peita Toffoli que fala javanês
Vitor Hugo Soares
Nos signos da comunicação e do mando, mal (ou bem?) comparando, o Procurador Geral da República, Augusto Aras, vinha sendo mostrado como uma espécie de “patinho feio” dos contos infanto-juvenis. Isso desde que o seu nome começou a ganhar musculatura, no cenário dos grandes espetáculos e atores da justiça e da política no Brasil, desde a configuração da possibilidade (concretizada) do procurador de 60 anos, – nascido em Salvador, no seio de família tradicional de políticos e figuras do Direito de Feira de Santana – chegar a um dos postos de maior relevância e visibilidade na hierarquia do poder no Brasil: a PGR, de autonomia garantida pela Constituição de 1988.
Ao contestar – peitar, no dizer nordestino – o presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, em reação firme contra a possibilidade de se restringir o compartilhamento, com o Ministério Público, de informações sigilosas do antigo Conselho de Controle da Atividade Financeira (COAF), rebatizado de Unidade de Inteligência Fiscal (UIF), encarando esta questão delicada decisiva, em muitas situações, para destravar e dar agilidade ao funcionamento da engrenagem de inteligência na apuração de atividades ilícitas, principalmente de corruptos e corruptores de alto rango –, Aras saiu de vez da coxia. Esta semana entrou para valer no pleno desempenho de sua relevante função pública.
Pode-se dizer, sem forçar a barra: aos 60 anos, o ex-aluno da Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia, Mestre em Direito Econômico pela UFBA e Doutor em Direito Constitucional pela PUC-SP, com larga experiência como procurador da Justiça Federal, fez de fato a sua estréia de gala no palco maior do judiciário brasileiro. Começa assim a trocar as vestes incômodas dos personagens ironizados das historietas infantis, pelas de tipos mais conceituados e relevantes, dos contos mais cultos e sofisticados de Andersen ou de Trancoso, marcantes no inconsciente cultural brasileiro, de crianças e adultos.
A torcida do Flamengo, gregos e baianos viram, inesperadamente (ou não?), na quarta-feira, um irreconhecível Toffoli, no desempenho sofrível do duplo papel de presidente do STF e relator deste polêmico e intrigante caso. O geralmente imperial presidente do STF parecia à beira de um ataque de nervos: inseguro, confuso e quase sem voz, precisando usar, desgraçadamente, um lenço para aliviar o nariz e a garganta. O que possibilitou as imagens desesperadoras, nada favoráveis ao ministro, editadas nos jornais e sites nacionais e estrangeiros. No relato do espanhol El País, o voto dele foi tão confuso que nem os demais ministros compreenderam o que estava sendo decidido. O ministro Roberto Barroso disse, em tom irônico, que era necessário chamar um professor de javanês para entender o que havia sido dito pelo presidente do Supremo.
Diante disso, fica fácil entender porque “os louros e aplausos da platéia”, foram quase todos, quarta-feira, dirigidos ao desempenho sóbrio, firme e determinado do soteropolitano Procurador Geral da República. O espetáculo ainda não acabou, mas o ato seguinte, de quinta-feira, no palco do Supremo, não foi melhor para Toffoli. O ministro Alexandre de Moraes deu voto divergente ao do imperial relator. Prosseguirá sema que vem com novos atos, até seu desfecho. Vale a pena acompanhar cada lance. E conferir.
Vitor Hugo Soares é jornalista, editor do site blog Bahia em Pauta.. E-mail: vitors.h@uol.com.br