“Paris e Salvador. Paris é uma cidade feminina. É o núcleo da mitologia urbana moderna e pós moderna. Mistura divina de Afrodite, Atenas e Artemis, filha de muitos tempos, a força guia e o farol para a difícil e misteriosa arte de amar. Paris convida a passear pelas ruas de braços dados, de mãos dadas, trocar beijos nas esquina, dançar … comer no bistrô Paul Bert, tomar um taça de vinho no Café Les Deux Magots e imaginar que Sartre e Simone de Beauvoir estão, na mesa ao lado, ao alcance dos olhos, conversando sobre existencialismo … convida a se perder no Marrais e sua ruas cheias de gente, com pequenos pedaços da África incrustados como exóticas pedras preciosas… ver a torre Eiffel ao longe( ou de perto ) envolta em névoas, dormir tarde, acordar tarde, comer sanduíche grego… Encontrar Diderrot, Danton, Robespierre e Napoleão no restaurante Le Procope (1686), na legendária rue de Ancienne Comèdie…
Não importam as multidões de chineses que parecem ubíquas nem os turistas seduzidos mais por tirar fotografias do que pela embriaguês da paisagem. É como abarcar o mundo com um único olhar, embora Paris também lembre uma esfiha ge sem olhos com suas histórias de rebeldia e morte da Comuna de Pária que horrorizou a Europa.
É como no Jogo das Amarelinhas, de Júlio Cortazar, você marca um encontro no Quartier Latin. Onde? O acaso dirá. O que importa é o prazer da busca, do encontro. E, em um instante de dúvida, faça como recomenda o romântico Baudelaire: embriague-se. De poesia, de vinho ou com a paisagem.
“É preciso estar sempre embriagado…E se, porventura, nos degraus de um palácio, sobre a relva verde de um fosso, na solidão morna do quarto, a embriaguez diminuir ou desaparecer quando você acordar, pergunte ao vento, à vaga, à estrela, ao pássaro, ao relógio, a tudo que flui, a tudo que geme, a tudo que gira, a tudo que canta, a tudo que fala, pergunte que horas são; e o vento, a vaga, a estrela, o pássaro, o relógio responderão: É hora de embriagar-se!“
Não seja escravo do tempo, nem dos compromissos, nem dos roteiros, nem… Embriague-se com a liberdade de ir e vir. Se perca nos labirintos da historia. E se reencontre. Sempre. Seja o senhor e a senhora do tempo. Vão, senhor e senhora do tempo, onde seus pés lhe levarem.
Sigam o curso do Sena. Vejam o casario elegante, as vitrines, os restaurantes, os teatros, os palácios, as livrarias, as galerias, a paisagem. Não tentem decifrar os mistérios da cidade , os ecos das antigas barricadas, nem conhecer as fadigas das longas solidões que devoram o sangue de milhões de seres anônimos.
Como no fino sonho de um espelho, entregue-se aos encantos da cidade. Imaginem: Benjamin e suas Passagen de Paris, a Prosa de Balzac e seus mitológicos Flaneurs, no didatismo de Eugène Sue com Os Mistérios de Paris, pense nos desejos humanos, na alegria e nas lutas sociais, no utopismo, a base para um sociedade bem regulada.
Embriaguemo-se. Ouçam as vozes de Edith Piaf.
Sonhem. Esse tempo é eterno. É o tempo idílico de sonhar. Esqueçam-se das lutas angustiantes pela sobrevivência. Esqueçam-se que foi em Paris que o jovem Marx inspirou-se no Vampiro para tecer suas teses revolucionárias condenando o capitalismo. Lembre-se de Meia-noite em Paris, je t’aime…
Entreguem-se à cidade como alguém que se deixa seduzir por um buquê de rosas vermelhas, a rústica beleza de uma casinha de campo, uma taça de Champagne. Pensem em maio de 1968 e nos estudantes, mas não só nas passeatas, nos embates com a policia, e , sim, nas noites de amor.
Noites sem fim. Noites que se bifurcam em outras e chegam de forma plural aos nossos dias. Embriaguemo-nos-se e acreditem,Paris é dos enamorados. Esse o seu maior segredo. Essa a fronteira que demarca os limites entre o sonho e a realidade.”