Tudo traz dentro de si o seu oposto, a sua antítese. Por isso, a inteligência é, a um só tempo, a grandeza e a desgraça dos homens. Daí o acre ditado popular segundo o qual dizer que os homens são racionais porque algumas vezes agem sensatamente, seria o mesmo que reconhecer que os cães são peixes porque sabem nadar.
A reflexão vem a propósito do inelutável fadário humano de repetir erros monumentais, constituindo o único caso de animal que tropeça muitas vezes na mesma pedra. Basta lembrar a facilidade com que as pessoas se deixam apanhar nas malhas da arrogância, quando são postas, ainda que momentaneamente, numa posição de aparente superioridade em relação aos próximos. O trágico destino de gente poderosa como Saddam Hussein e Omar Kadhafi não serviram de exemplo para grandes vigaristas em toda parte, inclusive no Brasil, onde ameaçam congestionar os presídios. Recorde-se que Kadhafi não foi capaz de perceber o que todos intuíam: que ele seria Hussein amanhã, arrancado de um buraco como se fosse um tatu, nosso simpático mamífero noctívago, desdentado, dasipodídeo, com seu corpo revestido de carapaça córnea.
Como o costume do cachimbo põe a boca torta, os brasileiros acostumados à crença de que no Brasil prisão é coisa para o tríplice P – pretos, pobres e putas -, não acreditaram que seriam apanhados no esgoto moral em que chafurdaram, como ratos, estes mamíferos roedores, murídeos, dotados de molares cuspidados. Apesar da crescente lotação dos presídios, parece que prospera a crença no retorno da impunidade para os infratores do colarinho branco, como se observa mundo afora e, sobretudo, Brasil adentro, onde políticos descomprometidos com o bem coletivo teimam em tirar partido da grave crise que assola o País, diante do qual se acendem luzes amarelas advertindo-nos para nos desviarmos do curso suicida das nações que optaram pela temerária rota do fracasso.
Mais próximo de nós, na vida cotidiana, vemos a repetição dessa lamentável tendência, de pessoas conhecidas olharem o próximo, de cima para baixo, quando quer que um pouco de fortuna lhes cubra a fronte. Desde os que se alçam a postos de relevo até inspetores de quarteirão, é grande a tentação de que se deixem dominar pelo lobo que lhes cutuca as vísceras, muito distantes do bucólico cordeiro que há pouco balia placidamente nas campinas. Observe-se que tais assomos de soberba que cegam as pessoas variam ao sabor dos valores de cada qual. Daí nasceu o provérbio iugoslavo que ensina: “Se você quiser conhecer o caráter de uma pessoa, coloque-a numa posição de autoridade”.
Os clássicos já disseram o fundamental sobre o comportamento humano, levando o pensador liberal inglês Lord Acton, nascido na Itália, a concluir com estas palavras em fogo: “All the power tends to corrupt, and absolute power to corrupt, absolutely”. (Todo poder tende a corromper e o poder absoluto (tende) a corromper, absolutamente (totalmente).
Usados com sabedoria, riqueza e poder podem ajudar na construção da felicidade. Recorde-se o aforismo de Nelson Rodrigues: “O dinheiro pode comprar até amor verdadeiro”. Na verdade, porém, a grande fortuna da vida consiste em viver com saúde e paz, quando se pode sorver o ar da noite, serenamente, com a consciência tranquila, sob um céu estrelado.
Joaci Góes é escritor, presidente da Academia de Letras da Bahia, ex-diretor da Tribuna da Bahia. Texto publicado nesta quinta-feira, na TB.
“Se entrega, Corisco”, Sergio Ricardo: direto da trilha musical que ornamenta a grandiosa cena final do filme de Glauber Rocha “Deus e o Diabo na Terra do Sol” , vivida com máxima intensidade dramática por Othon Bastos, o notável ator nascido em Tucano, que recebe nesta sexta-feira,7 de junho, o título de filho honorário da Cidade da Bahia. Merecidamente.
O corte de Neymar da seleção brasileira, na madrugada desta quinta-feira (6), após uma ruptura ligamentar no tornozelo direito durante a partida contra o Qatar, em Brasília, foi o desfecho de 13 dias bastante turbulentos para o atacante da seleção.
No período, Neymar até recebeu apoio de torcedores brasileiros, como no amistoso desta quarta (5), mas o número de reveses foi bem maior e contemplou desde a perda da braçadeira de capitão a uma acusação de estupro em Paris, que lhe rendeu duas investigações no Brasil.
Uma delas é pela suposta violência sexual, e a outra, por crime de informática. Ao se defender da primeira, ele expôs conversas com a denunciante. Nelas, foram exibidas imagens da mulher nua e seminua -com o rosto e partes íntimas borradas.
Neymar (Foto: REUTERS/Ueslei Marcelino)
Neymar se juntou à seleção brasileira no dia 25 de maio, com três dias de antecedência do que estava inicialmente previsto, após chegar de helicóptero à Granja Comary, em Teresópolis.
O adiantamento causou polêmica no PSG. O técnico da equipe, Thomas Tuchel, disse não ter sido avisado da liberação, que só foi informada à direção do time francês.
O atacante desembarcou no CT da CBF sob desconfiança. Algumas semanas antes, ele havia agredido um torcedor depois de derrota do PSG contra o Rennes, na final da Copa da França. A expectativa era se, após o incidente, Tite iria lhe tirar a faixa de capitão da seleção.
No domingo, 26 de maio, o atleta foi informado pelo treinador da perda da braçadeira, conquistada logo depois do revés da equipe na Copa do Mundo da Rússia. Neymar encarou o fato com naturalidade e evitou comentar. O amigo Daniel Alves herdou a capitania.
Três dias depois, Neymar treinava normalmente com a seleção brasileira quando deu o primeiro susto: sentiu dores no joelho esquerdo e deixou a atividade. Antes disso, havia levado uma bola por entre as pernas de Weverton, lateral de 19 anos do Cruzeiro convidado para completar os treinos da seleção principal.
Mas a parte mais séria ainda estava por vir. Já recuperado do susto no joelho, Neymar estava de folga no dia 1º de junho quando veio à tona uma denúncia. Uma mulher registrara boletim de ocorrência em São Paulo acusando-o de estupro em Paris, no dia 15 de maio.
O caso se tornou público e tumultuou o ambiente da seleção brasileira. No mesmo dia, em resposta, Neymar postou um vídeo em seu perfil no Instagram para se defender da acusação.
No vídeo de sete minutos, o jogador divulgou imagens íntimas da mulher que o acusa, na época ainda desconhecida. No fim da gravação, ele expôs também o nome da denunciante e de seu filho de cinco anos. O teor da mensagem assustou seus patrocinadores.
Na segunda (3), a Nike divulgou comunicado em que se dizia estar “profundamente preocupada” com as acusações. A Mastercard seguiu o mesmo caminho e, inclusive, interrompeu campanha publicitária que estava prevista com o jogador durante a Copa América. A Red Bull e a EA Sports também cobraram os representantes do atleta por uma posição.
Em meio ao turbilhão, Neymar ganhou o apoio dos torcedores brasileiros que o aguardavam na chegada da seleção em Brasília, na terça (4). O atleta foi o mais ovacionado no desembarque. O carinho continuou enquanto ele esteve em campo durante o amistoso contra o Qatar. Cada toque na bola do jogador resultava em aplausos e gritos.
Pouco antes da partida, contudo, a polêmica em torno das acusações havia aumentado. A modelo Najila Trindade falou publicamente sobre o caso pela primeira vez, em entrevista ao SBT, e reforçou a acusação de estupro contra o jogador. Segundo a denúncia dela, a agressão sexual começou após ele ter se recusado a utilizar preservativo.
Nesta quarta, também circulou em redes sociais um vídeo do dia seguinte ao suposto abuso, com confronto físico entre o atleta e a modelo. Quase simultaneamente, em Brasília, com menos de 20 minutos de partida, Neymar sentiu o tornozelo e deixou o gramado, às lágrimas. Teve a lesão no tornozelo confirmada e foi cortado da Copa América horas depois.
Na manhã desta quinta (7), ele entrou em uma van e deixou, acompanhado do pai, o hotel onde estava com a seleção.
Presidente pediu “racionalidade” a argentinos em eleição
Do Jornal do Brasil
O presidente Jair Bolsonaro disse nesta quinta-feira, em Buenos Aires, que há uma preocupação na América do Sul com a possibilidade de surgirem “novas Venezuelas” na região e, ao lado de seu colega argentino, Mauricio Macri, fez um apelo para que os argentinos sejam mais racionais e menos emocionais ao votarem na eleição presidencial deste ano no país.
“Eu acho que toda a América do Sul está preocupada que não tenhamos novas Venezuelas na região. Devemos nos preocupar e tomar decisões concretas neste sentido”, disse Bolsonaro em declaração conjunta ao lado de Macri, que tentará a reeleição no pleito de outubro, quando terá como principal adversário Alberto Fernández, ex-chefe de gabinete da Presidência e que tem como candidata a vice a ex-presidente argentina Cristina Kirchner.
Presidentes Mauricio Macri, da Argentina, e Jair Bolsonaro se cumprimentam em Buenos Aires (Foto: REUTERS/Agustin Marcarian)
Bolsonaro já se manifestou publicamente contrário à volta de Cristina ao poder, afirmando que isso seria um retrocesso e que poderia transformar a Argentina em uma nova Venezuela, país que vive uma crise econômica, social e política sob comando de Nicolás Maduro.
“Conclamo ao povo argentino que Deus abençoe a todos eles, porque terão pela frente agora, mês de outubro, eleições. E todos têm que ter –assim como no Brasil grande parte teve– muita responsabilidade, muita razão e menos emoção para decidir o futuro desse país maravilhoso que é a Argentina”, disse Bolsonaro.
“Que Deus abençoe o povo argentino para esse momento que se aproxima, para que possa escolher o melhor, porque dessa forma teremos paz, teremos prosperidade e alegria entre os nossos povos”, acrescentou.
Ele também disse que o Mercosul –formado além de Brasil e Argentina por Uruguai e Paraguai– está “na iminência” de assinar um acordo comercial com a União Europeia, e elogiou o esforço de Macri nas negociações.
O presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, com o seu homólogo argentino, Mauricio Macri, nesta quinta-feira em Buenos Aires.Natacha PisarenkoAP
A Argentina e o Brasil acreditam que em poucas semanas poderia ser finalmente alcançado, após décadas de negociações e fracassos, um acordo entre o Mercosul e a União Europeia (UE). “Precisamos integrar nossos mercados e garantir nossa inserção no desenvolvimento global”, afirmou Mauricio Macri, ao lado de Jair Bolsonaro, durante a primeira visita oficial do presidente brasileiro a Buenos Aires. Macri disse que os argentinos estavam “felizes em recebê-lo”, apesar das manifestações convocadas para rechaçar a presença de Bolsonaro.
Os dois mandatários se mostraram de acordo em temas como a cooperação comercial e energética, o combate ao narcotráfico e à corrupção e a crise na Venezuela. A conexão pessoal e ideológica pareceu evidente. Talvez até demais para um Macri que tenta projetar uma imagem de liberalismo moderado. Bolsonaro, expoente da ultradireita latino-americana, chamou Macri de “irmão” e lhe desejou sucesso nas eleições gerais de outubro: e deixar levar pela emoção”, disse o mandatário brasileiro. “O povo argentino deve votar com responsabilidade, sem são queremos novas Venezuelas.” Foi uma forma de identificar os grandes rivais de Macri — os peronistas Aberto Fernández e Cristina Fernández de Kirchner — com o regime bolivariano de Caracas.
Bolsonaro deixou uma pequena ferida no orgulho argentino quando, após assumir a presidência, em 1º de janeiro, escolheu o Chile como destino de sua primeira visita oficial, quebrando a tradição dos seus antecessores, que haviam estado em Buenos Aires no início de seus mandatos. Foi Macri que teve de viajar a Brasília em 15 de janeiro. As relações estavam bastante mornas nesse momento, pois Bolsonaro havia dito na campanha que nem a Argentina nem o Mercosul estavam entre suas prioridades.
Agora que a visita foi finalmente organizada, transcorre sem muita pompa: em menos de 24 horas e com uma agenda muito apertada, em parte para evitar ao máximo os protestos populares. O presidente brasileiro chegou a Buenos Aires por volta das 10h e depositou flores em frente ao monumento ao general San Martín. Depois foi à Casa Rosada para se reunir com Macri durante 45 minutos. Em seguida, os mandatários falaram à imprensa (sem aceitar perguntas) e almoçaram. Durante a tarde, a agenda de Bolsonaro incluía um seminário sobre defesa na embaixada brasileira e um encontro com empresários argentinos no hotel onde se hospeda, o Alvear, para depois manter uma reunião protocolar com os presidentes da Câmara, do Senado e da Corte Suprema. Seu voo de volta ao Brasil estava previsto para 6h40 desta sexta-feira.
Bolsonaro se mostra agora mais interessado que há alguns meses na reforma do Mercosul e na assinatura de um acordo com a UE. Tanto a Argentina como o Brasil enfrentam recessão, e seus Governos aplicam políticas de ajuste. Ambos precisam de oxigênio. Na Comissão Europeia e na Casa Rosada, acredita-se que o acordo com o bloco europeu poderia ser alcançado antes de agosto. Mas ainda há dificuldades. O presidente francês, Emmanuel Macron, teme uma avalanche de produtos agrícolas brasileiros e sobretudo argentinos, submetidos a menos regulações sanitárias que os europeus e mais baratos. Já os empresários do Brasil e da Argentina têm medo de que uma redução na tarifa externa do Mercosul (de 35%) os faça enfrentar a competição de produtos europeus com boa imagem de marca e alta qualidade.
Tampouco parece simples a aprovação parlamentar de um acordo. O peronismo, tanto o moderado como o kirchnerista, conta com maioria relativa nas duas câmaras argentinas e sempre tendeu para o protecionismo. As perspectivas sobre um hipotético acordo entre o Mercosul e a UE ficarão mais claras a partir de 14 de julho, quando o Brasil e a Argentina, as duas potências do bloco, se reúnem em Santa Fe com os parceiros menores, Uruguai e Paraguai, para tentar adotar uma postura conjunta.
Na Casa Rosada, Macri e Bolsonaro conversaram também sobre as conexões físicas entre os dois países, bastante deficientes, e sobre a cooperação energética. A Argentina possui tecnologia nuclear e uma promissora bacia de gás e petróleo em Vaca Muerta (Patagônia).
Sobre a Venezuela, os mandatários mostraram completa sintonia. Disseram estar dispostos a “fazer todo o possível para que se restabeleça a democracia” no país. O problema, como de costume, é o que fazer ante uma situação bloqueada: Nicolás Maduro se mantém no poder, e Juan Guaidó, reconhecido como presidente legítimo pela comunidade internacional, não consegue fazer valer esse apoio. A população venezuelana continua sofrendo um interminável desastre que combina repressão, inflação e carência de produtos básicos. Pelo menos publicamente, Macri e Bolsonaro não propuseram nenhuma ideia nova