DO EL PAIS
Afonso Benites
Brasília
O processo do impeachment da presidenta Dilma Rousseff (PT) voltou praticamente à estaca zero na Câmara. O Supremo Tribunal Federal decidiu nesta quinta-feira que a votação feita pelos deputados para escolher a comissão especial do impeachment, atualmente com composição hostil ao Governo, foi irregular e terá de ser repetida. A definição da mais alta corte do Judiciário brasileiro pode ser considerada uma importante vitória para a frágil gestão Rousseff, ainda mais levando em conta que os ministros deram ao Senado, onde a presidenta tem base parlamentar mais sólida, o poder de barrar o impedimento mesmo que deputados aprovem a abertura do processo. Se a oposição conseguir dois terços dos votos a favor da admissão do processo na Câmara, o Senado ainda precisará analisar o assunto e só com a concordância dos senadores é que a mandatária poderia ser afastada temporariamente do cargo por 180 dias.
No julgamento que durou pouco mais de cinco horas, os ministros decidiram ainda que os votos para a escolha da comissão especial do impeachment deve ocorrer de maneira aberta, e não secreta como foi, e que não era admitida a inscrição de uma chapa alternativa, como ocorreu. O presidente da Câmara, Eduardo Cunha, reagiu e disse que as determinações do Supremo sobre as votações não estão claras e podem inviabilizar a escolha, de fato, da instância. Ele considera recorrer delas por meio dos chamados embargos, instrumento para questionar decisões da corte superior.
A história do julgamento começou a ser definida quando o ministro Luis Roberto Barroso leu seu voto com grandes divergências em relação à argumentação do relator Luiz Fachin, apresentado na quarta-feira. Fachin causou preocupação no Planalto ao praticamente validar todo o processo em curso na Câmara, o que seria uma vantagem para Cunha, desafeto aberto de Rousseff. Foi Barroso, no entanto, que acabou obtendo o apoio da maioria de seus colegas.
“A Câmara dá uma autorização ao Senado, e não uma determinação”, afirmou o ministro Roberto Barroso, que apresentou divergências com relação ao voto do relator Luiz Fachin apresentado na quarta-feira e acabou obtendo o apoio da maioria de seus colegas.
A questão pode ser determinante porque, no Senado, a gestão Rousseff tem uma base mais confortável do que na Câmara e costuma ter maior facilidade em aprovar os projetos de seu interesse. E se a maioria simples dos senadores não concordarem com a abertura do processo, o impeachment nem chega a ser julgado. Ao menos dois ministros do STF (Gilmar Mendes e Dias Toffoli) ressaltaram, porém, que, se o Governo não conseguir os 171 votos para impedir o avanço do processo, ele demonstra que não tem a mínima condição de governar. “Ninguém vai ser salvo de impeachment por cautelar ou por interferência do Judiciário. Se não tiver 171 votos não resiste”, ressaltou Mendes durante o julgamento.
Houve uma série de divergências nos debates entre os ministros. O placar dos principais pontos foi o seguinte. No quesito sobre a votação aberta para a formação da comissão especial foram 6 votos a favor e 5 contra. Com relação a formação de uma chapa avulsa para esta comissão, foram 7 votos contrários e 4 favoráveis. Já no caso do Senado, o resultado foi 8 a 3, para que os senadores se manifestassem antes da pronúncia.
O governo petista não obteve apenas vitórias na análise do Supremo sobre uma ação movida pelo aliado PCdoB. Os ministros entenderam que a presidenta não precisava apresentar sua defesa prévia antes da votação na Câmara. O STF decidiu que a lei do impeachment (1.079/50) e a Constituição Federal apontam que a defesa só ocorrerá depois de aberto o procedimento.
Novo cronograma e reações
Agora, o processo só poderá ser reaberto depois da publicação do acórdão no Diário da Justiça, o que deverá ocorrer apenas entre janeiro e fevereiro. Neste período, tanto o Legislativo quanto o Judiciário estarão em recesso. Os trabalhos só deverão retornar na primeira semana de fevereiro e, dessa maneira, o processo do impeachment de Dilma deverá ser prorrogado até meados de abril, ao menos. Isso porque será necessário novamente compor a comissão especial do impeachment, conceder dez sessões para a presidenta se defender, outras cinco sessões para este colegiado elaborar o seu relatório e mais dois dias para o relatório seguir para a votação do plenário da Câmara.
Para opositores ao Governo Rousseff, a decisão foi uma afronta à própria Câmara. “O STF minimizou a importância da Câmara e de três quartos da população brasileira que se veem representadas nela. Tudo o que ela disser vai depender do Senado”, afirmou o líder da minoria, deputado Bruno Araújo (PSDB-PE). A não aceitação da concorrência com chapas avulsas também foi questionada por Araújo. “Respeitamos a decisão, mas agora ficaremos presos à ditadura dos líderes partidários, que só eles poderão escolher os membros da comissão”, afirmou.
O deputado Rubens Pereira Júnior, um dos autores da ação pelo PCdoB, disse que a decisão do STF restabelece a ordem ao Congresso Nacional. “Estavam tentando dar um golpe com uma eleição irregular. Agora, temos um rito bem definido e vamos para o enfrentamento político. Neste campo não temos problema em debater, mas desde que as regras sejam claras”, afirmou ao fim da sessão do Supremo.
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