Intenção de consumo das famÃlias teve queda em fevereiro.
/ Marcos Santos/ El Pais
DEU NO EL PAIS
HeloÃsa Mendonça
De São Paulo
Em meio a uma avalanche de resultados e previsões ruins para a economia brasileira, a divulgação do crescimento de 0,1% do PIB em 2014, dias depois da notÃcia da manutenção da nota de risco do Brasil pela agência de risco Standard & Poors, foi um fator de alÃvio para o Governo.
Na opinião da economista Zeina Latif, o aperfeiçoamento da metodologia do cálculo que mede as riquezas do Brasil, que incluiu novos dados de investimentos, contribuiu para que se engordasse a conta final do PIB do ano passado. Mas isso não pode ser considerado como uma vitória. “De qualquer forma, o fato é que estamos falando de uma economia estagnada e com o setor privado em um quadro recessivo. O que se viu é que ainda não batemos no fundo do poço, mas o próximo semestre já deve refletir a paralisia atual dos investimentos, a queda na confiança do consumidor e ainda há muitos ajustes para serem postos em prática”, explica.
No entanto, a especialista ressalta que a “sensação térmica” ainda não atingiu um quadro de crise. “O retrato hoje não é de um paÃs em crise e sim de uma população decepcionada, que não realizou o sonho de consumo sem se endividar. Mas é um momento muito distante das crises vividas pelo paÃs no passado”, explica.
A decisão da agência S&P – baseada na esperança de que a mudança na maneira de conduzir as polÃticas econômicas retome o crescimento – também reforça a importância das medidas do ajuste das contas públicas, que enfrentam a oposição da base do Governo no Congresso, e pressiona ainda mais sua execução.
“As agências estão dando algum crédito ao paÃs. Um voto de confiança do esforço para colocar em marcha o ajuste fiscal. Há uma dificuldade de natureza polÃtica para que os objetivos sejam alcançados, mas elas percebem que o paÃs precisa de um tempo para mostrar se é possÃvel dar uma guinada”, afirma o economista AluÃsio Campelo.
Atualmente, mais da metade da bancada petista é contra o ajuste fiscal na forma em que foi proposta e discordam principalmente das Medidas Provisórias (MPs) que alteram o acesso a benefÃcios, como o seguro-desemprego e a pensão por morte, segundo mostra levantamento realizado pelo jornal “O Globo”. E é exatamente esse embate polÃtico que torna o quadro econômico extremamente desafiador na percepção de Gustavo Loyola, ex-presidente do Banco Central.
“Joaquim Levy colocou no rumo certo a economia, mas a cartilha dele não é a mesma de Dilma e da própria base aliada, gerando um ceticismo se o ajuste vai sair”, afirmou o economista em evento do Instituto de Advogados de São Paulo. “E será justamente o ministro que Dilma teve que aceitar contra gosto que evitará que o navio afunde, mas o barco ainda vai balançar muito”, completou.
Apesar do cenário difÃcil, Loyola acredita que não há uma crise instaurada já que a situação que a atravessa o paÃs pode ser ultrapassada com bons fundamentos. “Há muitos desafios, mas não há uma crise como a de outras economias de vizinhos como Venezuela e Argentina. Somos mais fortes, com um governo incompetente, mas as instituições aguentam”, explica.
Na opinião do economista, atualmente estamos pagando pelos “erros grosseiros” de polÃticas econômicas dos últimos anos. “Por isso, agora vivemos o pior dos mundos: recessão e inflação. Prova é que, desde 2003, não tÃnhamos uma queda tão grande no consumo das famÃlias. Para completar, o último bastião da saúde do governo está caindo: o emprego”.
De fato, os dados não são animadores. Neste mês, a intenção de consumo das famÃlias caiu 11,9%, em relação a março de 2014, registrando o menor nÃvel da série histórica, segundo a Confederação Nacional de Comércios de Bens, Serviços e Turismo (CNC). Nesta sexta, os resultados do PIB confirmam um crescimento menor da renda, mostrando que a inércia positiva ainda prepondera, mas em menor ritmo. Já a taxa de desemprego atingiu o maior nÃvel desde junho de 2013, e chegou a 5,9% em fevereiro, com o aumento da procura de trabalho associada à dispensa de trabalhadores de vários setores.
A atividade industrial é uma das que já sentem os efeitos da desaceleração da economia. A produção no setor seguiu em queda em fevereiro e registrou baixo no número de empregados, de acordo com dados da Sondagem Industrial do mês passado. Segundo o IBGE, em 2014,teve queda de 1,2% em relação ao ano interior.
Para Flávio Castelo Branco, da Confederação Nacional da Indústria, a deterioração das condições da economia se agravou nos últimos meses. “Não é apenas o ajuste fiscal, há uma instabilidade no câmbio e um desgaste na base polÃtica. Sem contar todas as implicações das investigações de corrupção na Petrobras. É muito difÃcil que o setor veja sinais de melhorias em 2016, como prometido pelo Governo”, afirma.
Mais otimista, do diretor de Pesquisas Macroeconômicas do Bradesco Octávio de Barros acredita que 2015 será de transição de uma nova plataforma, mas não de desespero. “O Brasil sempre superou sua crise e Joaquim Levy já reverteu a polÃtica econômica dos últimos 4 anos. Ela vai se recuperar. Estamos apenas no começo do novo mandato. A inflação deste ano não pode ser vista como um fantasma e sim como um mal necessário”, afirma.
A previsão do Banco Bradesco é que a partir do segundo semestre os indicadores de confiança se recuperem. “Joaquim Levy é um sedutor, ele gosta de seduzir pelo argumento técnico e vai conseguir. O paÃs precisa se reencontrar, virar a página do Petrobras e criar um ambiente que o setor privado tenha um papel protagonista”, explica.