Governadores do Nordeste com Dilma em Sergipe: “ETs?”
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Órfãos da infinita seca
Janio Ferreira Soares
A leitura que se pode fazer da foto de Dilma reunida com os governadores nordestinos para tratar dos problemas da estiagem, é a de que parece que todos são extraterrestres que acabaram de chegar por aqui e (“oh, surpresa!”) encontraram o sertão esturricado, coitado, como se a seca fosse apenas uma turista acidental que, cansada de atravessar o deserto de Saara, deve ter acordado numa quentíssima manhã de sol e dito: “Allah, meu bom Allah, acho que eu vou mudar um pouco de ares. Vou dar um rolê pelo interior do Nordeste, matar uns bois, secar uns açudes e fazer um belo estrago nos pés de milho que o sertanejo plantou no dia de São José achando que iria colhê-los no São João. Volto antes do Carnaval, para não ter que ouvir neguinho lhe pedindo para mandar água pra Ioiô”.
Tudo bem que a estiagem atual é uma das maiores dos últimos anos, mas, desculpe a redundância, ela é exatamente igual àquela que passou e igualmente igual àquela que virá, só mudando seu tempo de permanência. Agora, o que me irrita é vê-la mais uma vez sendo tratada com um misto de admiração e desdém pelos nossos governantes e por apresentadores de telejornais, que adoram se comover e franzir o cenho diante do gado se estrebuchando no chão, mas já no bloco seguinte abrem o maior sorriso para comemorar mais um golaço de Neymar.
Sabe o que comove de verdade? É ver seu Antônio, seu João e seu Zé, ganhando o mundo antes que o impiedoso clarão do dia cruze seus fachos pelos furos das telhas e transforme o chão de seus barracos numa triste rave comandada por calejados DJs e suas enxadas nas costas; é vê-los sempre agradecendo e se benzendo quando voltam e passam diante do calendário com a gravura do Sagrado Coração de Jesus pregado no reboco, ali somente para confortá-los e lhes dar alento, pois os dias nascem e morrem sempre iguais; é sabê-los José, João e Antônio, nomes santos que são, implorando clemência aos céus e recebendo em troca esmolas travestidas de ajuda oficial. Mas o que dói mesmo é vê-los resignados, humildemente dizendo: “amém”.
Janio Ferreira Soares, cronista, e secretario de Cultura, Turismo e Esportes de Paulo Afonso, na margem baiana do Rio São Francisco
Janio,
Já que você puxou da seca à fé do sertanejo, tive vontade de citar uma duas ou três frases: “Bem aventurados os que sofrem, porque eles serão consolados” e, ainda mais apropriada, “Bem aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque eles serão saciados”. Ambas, todo mundo sabe, de J.C. Dói realmente vê-los resignados, humildemente dizendo “amém”, mas o mesmo autor das frases anteriores disse também: “Se te arrancam a capa, oferece-lhes também a túnica”.
Abraço.
bela colocação, Ivan!
mas vale lembrar, também, que para o sertanejo, a idéia de Deus, e Jesus, ou do santo que irá salvá-lo encarna em seres vivos.
já foi o beato Antonio Conselheiro, o coroné que dava uma moringa de barro ou uma dentadura, o Padim Pádi Ciço, o Frei Damião.
mas nenhum deles alcança a grandeza de São Lullla, o sumo pontífice da lábia de mel.
aquele que aponta o sol e diz que está chovendo, e, de súbito, todo sertanejo “come o reggae” do Cara dos caras.