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Exemplos da história em Portugal
Washington de Souza Filho
Direto de Covilhã , especial para o Bahia em Pauta
O mês de abril, mesmo com o apontado período de seca meteorológica, corresponde em Portugal a um ditado popular, muito usado no Brasil e conhecido por aqui, apesar de parte da Primavera: “Abril, chuvas mil”. A presença da chuva e temperaturas ainda baixas, apesar da primavera, não afasta da memória dois fatos, um deles com relação direta com a história brasileira, que merecem um tratamento dos portugueses, autoridades e cidadãos, que podem servir de exemplo para brasileiros de níveis iguais.
O primeiro fato, mais distante no tempo, está relacionado à data que está registrada como a do descobrimento do Brasil, em 22 de abril. Pedro Álvares Cabral, o navegante português, financiado pelos reis da Espanha, que comandou a esquadra que aportou no Sul da Bahia, na região de Porto Seguro, nasceu em Belmonte, cidade da Beira Interior, a uma distância de não mais de 30 quilômetros de Covilhã. A cidade usa esta referência, a do lugar onde nasceu Pedro Álvares Cabral para, nesta época de crise econômica na Europa, com efeitos graves em Portugal, para explorar a imagem do descobridor e a implantação de uma rede de museus, inclusive um mais específico, para a preservação da história dos judeus.
A região da Beira Interior, Belmonte em especial, foi para onde os judeus acorreram, no período da Inquisição, e estabeleceram um modo de vida, como cristãos-novos, através da qual preservaram as tradições judaicas. Um jeito de viver, em que a adesão ao catolicismo era, apenas, formal.
O Museu Judaico, ao lado do Museu dos Descobrimentos – uma referência à atuação dos portugueses, no período das grandes navegações – é um dos cincos de Belmonte, que ainda tem uma ruína construída pelos romanos, foi um dos caminhos para Santiago de Compostela e usa uma antiga moagem de oliveira para preservar a produção do azeite de oliva. São atividades que geram emprego e renda.
O mês de abril em Portugal é o da comemoração da liberdade, no dia 25. É a data da Revolução dos Cravos, o movimento organizado por integrantes das Forças Armadas, que derrubou o salazarismo, em 1974. Quase 40 anos depois, a sombra de Oliveira Salazar, o personalista ditador português, ainda paira na vida do país.
Em estudos acadêmicos é um assunto que tem sido revisitado, como na pesquisa do português Filipe Ribeiro de Menezes, obra publicada no Brasil, em 2011. No cotidiano, a questão é outra.
A administração de Santa Comba Dão, o lugar onde nasceu Salazar, anunciou o interesse em comprar a produção de vinho da família e usar o nome ditador como marca. Uma proposta que mereceu reações diversas, principalmente de historiadores, de acordo com os jornais que trataram do assunto, a maior parte de desapreço pela proposta – “no mínimo de, é de mau gosto, no máximo um insulto às vítimas do Estado Novo”, disse ao jornal Público, o historiador Filipe de Menezes. O mesmo tom de outro tema, relacionado ao ditador, que foi relembrado: a implantação de um museu, na casa onde ele viveu.
A intenção é a mesma de Belmonte. Aproveitar a importância histórica para melhorar a renda de uma região. Mesmo que no caso de Cabral na cidade onde nasceu esteja, apenas, parte dos seus restos mortais, já que o seu sepultamento foi na região de Santarém, em relação a Salazar o problema é outro. Portugal passou todo este tempo querendo esquecer o passado que une a história do país a do seu ditador
A derrubada dele provocou uma situação comum, em qualquer canto do país. No lugar que tinha uma via com o nome de Oliveira Salazar, a denominação mudou para 25 de Abril. A troca mais conhecida é o nome da Ponte do Tejo, um cartão-postal de Lisboa, identificada com a data que é comemorada em Portugal como o Dia da Liberdade.
A razão pode ser de ordem econômica ou política, mas a história é a realidade de uma nação e do seu povo, que precisa ser enfrentada. Mesmo quando o debate sobre a verdade, passe pela necessidade de enfrentar os seus mitos. São exemplos que servem para o Brasil.
Washington de Souza Filho, jornalista, professor da Universidade Federal da Bahia, vive em Covilhã, onde cursa doutorado em Comunicação na Universidade da Beira Interior.