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OPINIÃO POLÍTICA
Posição irresponsável
Ivan de Carvalho
Se não ocorrerem mudanças importantes até a quarta-feira, a 66ª Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas será aberta em clima muito mais tenso do que talvez qualquer outra até então.
Não é uma afirmação definitiva, pois isso exigiria ao menos uma ligeira pesquisa histórica, mas desde que a ONU foi criada, uma Assembleia Geral da Organização dificilmente irá se deparar com tema tão complicado – o do reconhecimento de um Estado Palestino, que reivindica também a consequência lógica dessa condição, que é sua inclusão entre os Estados-Membros da ONU.
Cabe aqui citar um fato interessante, do conhecimento geral. A sessão especial da Assembleia Geral da ONU que aprovou e acolheu o Estado de Israel, em 16 de setembro de 1947, foi presidida pelo delegado brasileiro Oswaldo Aranha, que já participara com destaque das articulações com o objetivo de assegurar aos hebreus, vítimas do Holocausto promovido pelo nazismo, um estado nacional.
A história registra que no momento mesmo em que instalou-se o governo no território que a ONU lhe destinou – uma parte modesta da antiga Terra Santa bíblica –, os países árabes em conjunto lhe declararam guerra.
E mesmo nessas difíceis circunstâncias, Israel venceu. Depois disso, houve mais duas guerras. Uma, em 1967, provocada por ações hostis do Egito (então com o nome adotivo de República Árabe Unida) e com envolvimento direto também da Jordânia e Síria; outra, em 1973, iniciada pelo Egito (que por causa da guerra anterior se encontrava em situação insustentável) e com a participação da Síria e inteligente omissão da Jordânia.
Algum tempo depois dessa terceira guerra entre israelenses e árabes, Egito e Jordânia firmaram tratados de paz com Israel. A Síria, cuja ditadura atualmente está matando milhares de seu próprio povo, não aceita sequer uma negociação direta com o Estado de Israel.
E, como se sabe, o prato de resistência dos governos árabes contra Israel é o problema dos palestinos, um povo que se acomodara na Terra Santa, onde existia o Estado de Israel antes da diáspora causada pela ação militar do Império Romano.
Israel já aceita a criação do Estado Palestino, mas sob condições que lhe garantam reconhecimento mútuo, relações diplomáticas normais e segurança, incluindo o que convencionou chamar de “fronteiras seguras”.
Na quarta-feira, cumprindo a tradição de o discurso do chefe da delegação brasileira é o discurso de abertura de toda Assembleia Geral da ONU, a presidente Dilma Rousseff inaugura a tribuna na quarta-feira. Será a primeira mulher a fazer o discurso inaugural de uma assembleia geral da Organização das Nações Unidas. Claro, há um simbolismo aí e já está sendo capitalizado politicamente.
Mas a presidente Dilma Rousseff vai tocar o ponto nevrálgico da Assembleia Geral que começa quarta-feira. Vai se pronunciar (como já o fizeram 130 outros países em outras circunstâncias) a favor do reconhecimento do Estado Palestino. Permito-me afirmar que é uma irresponsabilidade.
A diferença crítica, no momento, é que desta vez a Autoridade Nacional Palestina (espécie de proto-estado palestino que tem o reconhecimento de Israel e de todo mundo) vai entregar pedido formal ao secretário geral da ONU para que seja admitido na entidade o Estado Palestino.
O pedido será submetido ao voto dos 15 membros do Conselho de Segurança e precisa de nove votos para ser aprovado. O Brasil deverá estar entre os nove. Mas há cinco membros permanentes (EUA, Rússia, China, Inglaterra e França) e qualquer deles pode exercer seu poder de veto e pôr fim ao processo. Rússia e China não o farão.
Se houve aprovação no CS e ninguém mais vetar, os Estados Unidos vetarão. Porque não fazer isto, permitindo que dois terços da Assembleia Geral declarem existente o Estado Palestino – criando-o, assim, na marra, sem um acordo com Israel – será apressar o início da guerra que, mais cedo ou mais tarde, ainda vai haver ali e poderá instantaneamente espalhar-se para o mundo quase todo.